Sem lugar, sem tempo
Não sei nem para quem
escrevo essa carta, provavelmente para mim mesma. Preciso me escutar,
colocar os sentimentos em ordem, entender melhor o que aconteceu e, o
mais importante, o que eu realmente quero para a minha vida. O que me
faz feliz? Quais são minhas prioridades...O dia a dia simplesmente
vai nos levando e esquecemos o mais básico, sou feliz? É isso que
quero para a minha vida? As vezes por medo da mudança continuamos no
mesmo lugar. Engraçado, quando eu era mais jovem não tinha medo de
nada e fiz grandes mudanças na minha vida...mudei de cidade, mudei
de pais, mudei de marido...com o tempo vamos nos acomodando, criamos
um medo do novo, do desconhecido...e lá ficamos, tranquilos e
imutáveis. Até o dia que uma bomba cai em nosso refúgio
confortável e somos, literalmente obrigados a nos mudar.
É mais ou menos assim
que me sinto, ainda apegada aos escombros mas obrigada a procurar uma
nova moradia pois essa é inabitável. Uma mescla de vontade de
recomeçar do zero e medo do desconhecido...Contradiçoes do ser
humano.
Depois da nossa conversa
no telefone cheguei a conclusão que estou muito longe do lugar aonde
quero estar, quando sinto um entendimento entre nós tudo desmorona!
Provavelmente porque os alicerces não estam solidificados, senão
não desmoronava...a pressa foi tanta que esquecemos que o terreno
era arenoso.
Conversei com minha
madrinha a respeito das minhas restrições com a clínica, ela foi
sincera...realmente existem alguns fatos concretos que me dão
direito de ficar com o pé atrás (e existem outras clínicas com uma
abordagem mais holística), mas minha necessidade de controlar também
aparece em algumas situações. Qual a solução? Ela sabiamente
disse, transfira ele e ponto final ou aceite e não interfira mais, o
que não dá para fazer é continuar neste comportamento. Lave as
suas mãos ou tome as rédeas da situação, mas decida e volte a
dormir, não tem meio termo (suas palavras). Acho que estava
precisando escutar o que eu já sabia! Mas como respeitar sua decisão
de ficar e lavar minhas mãos... a clínica que você escolheu não
ofereceu um programa de terapia familiar semanal (como as outras, nem
mensal alias terapia familiar nenhuma!), não individualiza o
tratamento de cada paciente, não inclui a família no processo de
recuperação de uma forma efetiva (alias restriguem o contato e
vínculo)...e depois simplesmente, te dão um diploma e desejam boa
sorte! Você me conhece, posso citar vários estudos, artigos
científicos e por ai vai (só não vou fazer psicologia porque não
gosto de gente, prefiro modelagem numérica).
Não resisti: O
apoio familiar é vital para a reestruturação do dependente
químico; tanto o processo de adoecimento quanto a recuperação
interfere na dinâmica familiar e por tal se faz necessário algum
tipo de orientação de suporte e apoio; e por fim, os
profissionais necessitam de auxílio de familiares na recuperação
do dependente. (Abordagem
familiar em dependência química, Paya e Figlie, 2009, UNIFESP).
Não resisti de novo:
Kalina
e Kovadloff (1988) definem que os elementos centrais das CT são: 1)
A CT é um elemento social. Esse sistema social deve facilitar uma
aprendizagem que, em si mesmo, é terapêutica; 2) O sistema é uma
ordem organizada através das normas de convivência e do
enquadramento de tarefas; 3) O enquadramento e a normatividade
baseiam-se no conceito da abstinência das drogas, enquanto se
realiza o aprendizado; 4) O trabalho concreto na instituição é a
base da disciplina institucional e de uma educação na
co-responsabilidade; 5) A CT tem hierarquias de acordo com as
conquistas que cada residente tenha feito e no conhecimento de si
mesmo, no trabalho sobre os outros e nas lideranças positivas que
possa ir progressivamente assumindo; 6) As mudanças na instituição
se concretizam através da mobilidade social, que implica a
transmissão de tarefas e de responsabilidades crescentes na CT
hierárquica; 7) A CT é uma sistemática de grupo, onde cada um dos
grupos responde a diferentes necessidades dos residentes. Alguns
seguem os alinhamentos típicos dos grupos terapêuticos. Outros
terão como função atacar os comportamentos negativos para a
sobrevivência do grupo e procurarão reforçar as conquistas
positivas e a estrutura grupal; 8) A família está continuamente
envolvida, de modo geral, em três níveis: participando da reunião
semanal de terapia e da reunião mensal multifamiliar e, quando bons
níveis de recuperação são alcançados, ajudando em projetos
preventivos ou integrando a associação de pais, com a finalidade de
trabalhar socialmente no tema da toxicomania e 9) A CT fracassará
em seus propósitos se o residente não for reconhecido em sua
singularidade não apenas por meio de um ato terapêutico
individual, mas fundamentalmente através de uma escuta institucional
de sua história de vida.
Porém,
essa metodologia de tratamento para a dependência de substâncias
psicoativas ainda requer diversos estudos para averiguar se o
"isolamento" do mundo em que havia o convívio com a
droga não pode ocasionar, no momento de saída da CT, uma recaída
devida à desadaptação social, já que a abstinência ocorreu em um
ambiente de privação tanto da substância quanto do grupo
social.
Bom, poderia escrever
paginas e mais páginas sobre este assunto mas acho que já deixei
bem claro os meus argumentos. Os três pontos que venho batendo à
tempo: a individualidade e necessidade de cada um baseado em seu
histórico de vida e familiar (não dá para colocar todo mundo na
mesma caixa), a falta de participação efetiva da família no
tratamento, e o isolamento com apenas uma resso antes de sair (não
um processo gradual de readaptação social). Enfim, não estou aqui
escrevendo nenhuma tese, apenas fundamentando meus questionamentos.
Isso não é
co-dependencia, é fato, realidade! Sua clínica não apresenta um
programa estruturado no qual os familiares sejam incluídos no
processo, a única coisa que eles fazem é sugerir que você
frequente os grupos (AE, NarAnon...), ótimo, conseguia fazer isso
por mim mesma sem a sugestão deles! E que venha nas visitas mensais
com um sorriso na cara e boa vontade. E a terapia familiar? Como
trabalhar a dinâmica familiar se não há espaço? Desculpe,
para mim não esta funcionando MESMO! Me sinto excluida, fazendo todo
o esforço que faço. Vocês (você e sua clínica) sabem o que estam
fazendo...ótimo, me deixem em paz então e não me cobrem nada
depois. Sem o nosso amor e apoio, nenhum dependente químico em
recuperação sobrevive limpo por muito tempo...mas o meu amor por
você não conta neste momento, não conseguimos reatar nossos laços
de carinho e compreensão, não podemos nos comunicar, não podemos
nada...então que seja!
Não vou mais ficar me
debatendo, muito menos nadando contra a corrente senão me afogo.
Beijo, Dona Barriga
Oi! Tenho o mesmo sentimento em relação à clínica do meu namorado. Eles agem dessa mesma forma. Se puder, me mande o nome por e-mail. Concordo 100% com vc. Que raiva!
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