quarta-feira, 6 de março de 2013

A realidade "mundo cão"


São Paulo, 29 de Janeiro de 2013

Querido Caiçara,

Acabei de voltar da sala e estou simplesmente devastada em qualquer emoção que possa ter. Anestesiada, chocada, paralisada...Não sei se você lembra de uma companheira, comentei dela, professora da USP mais ou menos a minha idade, sempre muito bem arrumada cujo filho tinha saído de 9 meses internado numa clínica muito renomada (e cara no interior) e tinha recaido. Fazia um bom tempo que ela não frequentava a sala e hoje ela estava lá, irreconhecível, destruida, muito sedada...o corpo do filho dela de 21 anos foi encontrado boiando num corrego da periferia na véspera do Natal com três tiros. Ela ganhou, hoje a droga ganhou, fez mais uma vítima, destruiu mais uma familia. E eu fiquei com tanto ódio, tanta raiva vendo as lágrimas escorrerem pelo rosto desta mãe que enterrou seu filho. Se essa merda de droga tivesse uma cara eu enchia ela de porrada! Mas ela não tem...ela é muito mais sutil.

Lembro bem das suas partilhas, do amor pelo filho, das inúmeras tentativas de ajudá-lo (a última internação foi involuntária mesmo), de apreender a não ser facilitadora, parar de procurar os porques (típica classe média alta: infância feliz, melhores escolas, viagens, diálogo, carinho) e se culpar pela doença dele. Não há dor maior do que enterrar um filho, ainda mais quando este é assassinado pelo trágico. Desculpe querido, sei que essas coisas acontecem 10 vezes por dia neste pais, mas estou tão revoltada! Quando você le no jornal é uma coisa, quando você vê a realidade nua e crua na sua frente é outra.

Cheguei em casa, me deu uma vontade enorme de abraçar o I., protegê-lo de todo esse SUBmundo...mas posso eu? Meu Deus, ter um filho neste mundo hoje é quase insano. O que fazer? E para complicar, andei lendo alguns artigos que dependência química pode apresentar traços hereditários! Pronto pirei, vou mudar para uma fazenda no meio do outback australiano e criar ovelhas longe do mundo. Não, melhor vou me mudar para Marte (lá não tem drogas MESMO). Caiçara, você estava usando drogas quando eu engravidei? Seja honesto. Na verdade estou pensando muito sobre isso e gostaria de marcar uma batelada de exames para o I., inclusive um mapeamento genético completo. Estou com os nervos a flor da pele.

Termino amanhã, estou muito triste.

Beijos,
Dona Barriga

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