São Paulo, 29 de Janeiro de 2013
Querido Caiçara,
Acabei de voltar da sala
e estou simplesmente devastada em qualquer emoção que possa ter.
Anestesiada, chocada, paralisada...Não sei se você lembra de uma
companheira, comentei dela, professora da USP mais ou menos a minha
idade, sempre muito bem arrumada cujo filho tinha saído de 9 meses
internado numa clínica muito renomada (e cara no interior) e tinha
recaido. Fazia um bom tempo que ela não frequentava a sala e hoje
ela estava lá, irreconhecível, destruida, muito sedada...o corpo do
filho dela de 21 anos foi encontrado boiando num corrego da
periferia na véspera do Natal com três tiros. Ela ganhou, hoje a
droga ganhou, fez mais uma vítima, destruiu mais uma familia. E eu
fiquei com tanto ódio, tanta raiva vendo as lágrimas escorrerem
pelo rosto desta mãe que enterrou seu filho. Se essa merda de droga
tivesse uma cara eu enchia ela de porrada! Mas ela não tem...ela é
muito mais sutil.
Lembro bem das suas
partilhas, do amor pelo filho, das inúmeras tentativas de ajudá-lo
(a última internação foi involuntária mesmo), de apreender a não
ser facilitadora, parar de procurar os porques (típica classe média
alta: infância feliz, melhores escolas, viagens, diálogo, carinho)
e se culpar pela doença dele. Não há dor maior do que enterrar um
filho, ainda mais quando este é assassinado pelo trágico. Desculpe querido, sei que essas coisas acontecem 10 vezes por dia neste
pais, mas estou tão revoltada! Quando você le no jornal é uma
coisa, quando você vê a realidade nua e crua na sua frente é
outra.
Cheguei em casa, me deu
uma vontade enorme de abraçar o I., protegê-lo de todo esse
SUBmundo...mas posso eu? Meu Deus, ter um filho neste mundo hoje é
quase insano. O que fazer? E para complicar, andei lendo alguns
artigos que dependência química pode apresentar traços
hereditários! Pronto pirei, vou mudar para uma fazenda no meio do
outback australiano e criar ovelhas longe do mundo. Não, melhor vou
me mudar para Marte (lá não tem drogas MESMO). Caiçara, você estava
usando drogas quando eu engravidei? Seja honesto. Na verdade estou
pensando muito sobre isso e gostaria de marcar uma batelada de exames
para o I., inclusive um mapeamento genético completo. Estou com os
nervos a flor da pele.
Termino amanhã, estou
muito triste.
Beijos,
Dona Barriga
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